Impossível imaginar minha história com o chá sem mencionar os Países Baixos(Holanda) e a Alemanha.
Holanda, porque foi ali que firmei laços de parentesco e amizade e onde me iniciei no mundo dos chás.
Alemanha, por ter sido o primeiro país que conheci após a Holanda. Foi amor à primeira vista, talvez até influenciada pelos meus sogros e marido. Foi uma identificação tão profunda que originou grandes amizades e relacionamentos de negócios.
O surpreendente é como estes dois países têm muito a ver com a história do chá e na qual ganhei experiências únicas.
Uma das mais recentes experiências, foi a rota da Frísia, nos Países Baixos, até Norden, na Frísia Oriental( Alemanha).
Os frísios são um grupo étnico germânico nativo das partes costeiras da Holanda e do noroeste da Alemanha.
O caminho até a Frísia Oriental revela a proximidade histórica e geográfica destas duas regiões. Ela está situada bem ao fundo da costa chuvosa alemã, no mar do Norte. É uma região extremamente voltada ao chá.
Após os portugueses, no início do século XVII, o chá chegou à Europa, pela Companhia Holandesa das Índias Orientais. Por volta de 1610 e através da VOC( Vereenigde Oostindische Compagnie), o chá foi introduzido à Frisia Oriental( Alemanha).
Inicialmente, como em muitos países asiáticos, o chá foi usado como remédio. Já no século 18, o chá tornou-se a melhor bebida na Frísia Oriental. Infelizmente, devido ao consumo popular de chá, o estado sofreu perdas devido à grande quantidade de importação de chá e impostos, o que resultou na proibição do chá em 1777, sob a lei do rei da Prússia, Frederico, o Grande. O chá foi então condenado como “veneno do dragão chinês”. Mesmo que a lei tenha sido abolida 2 anos depois, ainda era difícil conseguir chá durante as Guerras Napoleônicas e a Segunda Guerra Mundial. Contudo, a escassez não impediu que os amantes do chá, da Frísia Oriental, fizessem bebidas aromatizantes artificiais de chá, usando ervas. Somente em 1953 que o imposto sobre o chá foi reduzido, tornando-se mais acessível e possibilitando que os frísios pudessem voltar a se deliciar com o chá de verdade.
Há muito a contar sobre os frísios da Holanda e da Alemanha, que preferimos dedicar, em outra oportunidade, um capítulo somente a esta parte histórica e geográfica.
A Frísia Oriental é coroada pela quantidade de chá bebida por pessoa e conforme dados da Associação de Chá da Alemanha, cerca de 300 litros por ano(cerca de 1270 xícaras de chá por pessoa), logo à frente do Kuwait e da Irlanda. O resto da Alemanha bebe apenas um décimo dessa quantidade, preferindo café. Portanto, se a Frísia Oriental fosse um país, seria o consumo de chá mais alto do mundo. Ali, o chá sempre teve um status elevado e a hora do chá tem um dialeto local.( Teetied,)
Apesar dos 300 anos de história do chá nesta região, onde beber chá faz parte da cultura, os frísios orientais desenvolveram sua própria mistura de chá chamada de “Ostfriesentee” e também sua maneira própria de servir.
Muitos países têm suas próprias versões da tradicional cerimônia do chá, como a ritualização da cultura do chá e que se originou milhares de anos atrás na China. Também influenciou japoneses e coreanos no desenvolvimento de suas próprias cerimônias.
A cerimônia do chá da Frísia Oriental não é comumente praticada no resto da Alemanha e é de fato uma tradição local. Porém, depois de experimentar e se tornar parte dela, você aprenderá a apreciar esse algo a mais sobre esta bebida.
Eventualmente, muitos percebem que não se trata de beber por beber, mas muito mais sobre tirar um tempo e desfrutar da atmosfera sociável, mas calma, criada por esse procedimento tão especial.
A tradição em si é uma espécie de cerimônia do chá que se inicia por volta das 15:00, mas muitos frísios não se restringem somente a esse horário para apreciar este chá. Em nossa visita pudemos comprovar que a qualquer hora do dia podemos aproveitar desta cerimônia.
A cultura do chá afetou a linguagem e a cultura nos acessórios. Existem muitos idiomas e expressões em baixo alemão em relação ao chá. O chá é bebido em louças típicas da Frísia Oriental com decoração em rosa, a chamada “East Frisian Rose” e também no chamado “Dresmer Blue”, este último talvez inspirado nas louças Delft da Holanda.
Mas o que é esta mistura tão especial e que muitos ainda não estão habituados a falar?
East Frisian tea é um chá preto de folhas soltas,principalmente uma mistura de Assams, mas você pode encontrá-lo com um toque de Ceilão. O que torna ainda mais acentuado seu sabor é a água da região, que é bem leve. Portanto, para preparar um autêntico e cerimonial chá da Frísia Oriental você necessita usar uma água que se aproxime do PH 7 e terá um resultado parecido.
Qual é o sabor do chá da Frísia?
Tem um sabor excitante, forte e maravilhosamente aromático, característico do Assam produzido com esmero.
A cerimônia do chá na Frísia Oriental nos surpreende, pois você experimenta três sabores em uma só xícara.
Passo a passo para a Cerimônia do Chá da Frísia Oriental.
Acessórios:
Conjunto de xícara e bule de porcelana( de aproximadamente 1 litro e a mais tradicional possível).
1 rechaud ( se possível, para deixar aquecido o chá).
Colher de chá.
Uma colher concha para o creme, pode ser também uma colher de chá comum.
Ingredientes:
Cristais de açúcar “Kluntjes”. Caso não haja pode ser cubos de açúcar normais.(não dará o mesmo efeito).
Creme: pode ser o creme de leite sem soro. ( O creme servido na Frísia Oriental é bem especial).
Chá “East Frisian”
Preparo:
Enxaguar a louça com água fervida e reservar outra parte da água para a preparação do chá.
Coloque um infusor tipo cesta no bule e deite 5 colheres de chá da mistura East Frisian. Derrame metade da água fervida sobre as folhas , tampe o bule e aguarde por 4 a 5 minutos.
Esta infusão será bem forte de uma cor acobreada. Derrame o restante da água. Seu chá está pronto para ser servido.
Coloque 2 a 3 pedrinhas de açúcar na xícara e depois o chá.
Derrame nas bordas da xícara o creme com a colher ou concha. Você perceberá nuvens de creme que vão lentamente descendo ao fundo e subindo novamente como pequenas borbulhas peroladas. É extremamente relaxante acompanhar este momento.. Esta nuvem é chamada de “Wulkje”.
Degustação:
Agora é o momento especial:
Desfrute primeiramente o sabor intenso e maltado desta mistura especial no seu primeiro gole ( o chá de Assam é visivelmente predominante), já no segundo gole você sentirá o sabor lácteo do creme e por último o sabor adocicado dos cristais de açúcar( Kluntjes) se misturando na bebida. Repita esta degustação por quantas vezes você quiser, 3 até 4 vezes.
Algo muito interessante é que a colher, ao lado da xícara, não é para ser usada para misturar e sim para sinalizar quando você deseja parar de ser servido. Também há a opção de colocar a xícara de cabeça para baixo para dizer que você já está satisfeito.
Aprecie cada gole, com tranquilidade, pois este é o comportamento dos frísios na hora do chá.
Ficamos encantados com a recepção do Museu de Chá de Norden na Frisia Oriental. Na época havia dois museus, o original e o comandado por Oswald von Diepholz e cuja coleção nos encantou. Infelizmente está desativado definitivamente.
Vale a pena também visitar o “Café tem Cate”, um local acolhedor, em um edifício histórico de 1878. É um convite apaixonante para esta cerimônia a qualquer horário e com acompanhamentos inesquecíveis e produzidos no local.
Provem! Apreciem! Vocês irão amar esta cerimônia.